O artigo abaixo foi publicado no Jornal GAZETA VALE PARAIBANA n. 50 e está disponível para download.
Alguém já parou para pensar que
qualidade na formação de alunos passa necessariamente pela qualidade na
formação do profissional de ensino?
Nestas poucas palavras será feita
uma reflexão sobre a formação e as condições de trabalho que o profissional
docente tem no nosso sistema de educação.
Pressupõe-se que o professor é um
profissional que está engajado na formação de uma sociedade crítica e que o
trabalho a ser desenvolvido em sala de aula trará ao aluno habilidades e competências
para que possa ser desenvolvido no campo social de trabalho e de convívio em
sociedade.
Para o professor, muitas vezes essa
função não está muito clara. Além de não ser clara ainda esbarra-se nos
problemas que essa profissão impõe para sua sobrevivência.
Começarei pelo desenvolvimento
intelectual do professor.
A indústria do ensino superior no
seu anseio por mais alunos e lucros, deixa de lado a capacitação do professor
de ensino superior e superlota salas de aula com alunos oriundos de varias
classes de ensino apresentando uma enorme discrepância na formação docente.
Os futuros docentes, por sua vez,
têm acesso a uma vasta rede de informação que deverá ser engolida em um curto
espaço de tempo, pois o seu acesso à sala de aula só será concretizada pós
diplomação.
O professor de ensino fundamental e
médio deve, via de regra, ter uma bagagem cultural condizente com o que se
apresenta em
sociedade. Deve freqüentar teatros, cinemas, ler livros de
assuntos variados, estar antenado em atualidades e dominar o seu conteúdo a ser
trabalhado em sala de aula.
Dentro do nosso sistema, um
professor que queira ter realmente acesso a esses bens de informação e de
formação contínua deverá incluir na sua cesta básica:
Jornal de atualidades, revista de
sua área de formação, livro, internet
banda larga, revista de educação, cinema, teatro e centros de exposições.
Fazendo um calculo médio, o professor deverá destinar, do seu salário,
aproximadamente R$ 250,00 com esses bens imateriais.
Vale lembrar que, para um professor
que ganha em média R $
1.000,00 isso representa 25% do seu salário. O que torna impraticável em muitos
dos casos.
Para um professor ter esses meios de
formação contínua, o mesmo teria que ganhar algo em torno de R$ 2.500,00 a R$ 3.000,00.
Para isso o profissional deverá se desdobrar e trabalhar nos três períodos e em
escolas diferentes (particulares inclusive).
O professor de carreira pública não
tem condições de se atualizar dessa forma. Primeiramente porque o governo não
oferece esses meios facilitados para os professores, segundo porque muitas
vezes, os próprios professores não têm a cultura de consumir esse tipo de
produto. Sendo assim, o aluno, que não vê o seu professor estudando, vai
estudar para que?
Outro problema que vivenciamos é a superlotação
de sala. Do ensino fundamental ao superior, o tratamento dispensados aos alunos
é o mesmo tratamento de massa aplicado desde sempre na escola. Turmas de 40
alunos e aulas de 50 minutos (salvo no ensino infantil e superior) torna-se
humanamente impossível que o professor tenha disposição e disponibilidade para
atender aluno por aluno, sanar suas dúvidas e corrigir atentamente todos os
trabalhos e avaliações.
Pense em uma professora que tem como
função alfabetizar alunos. Imagine 40 alunos em uma sala de aula sendo todos
alfabetizados ao mesmo tempo. Como essa professora procede? Qual é a magia que
ela aplica para tentar alfabetizar pelo menos 50% desse contingente? Não é de
se espantar que as crianças chegam no 6º ano do ensino fundamental sem saber
ler e escrever. Não há trabalho milagroso que faça esta magia.
A alfabetização vai ser dada ao
longo do tempo e ao chegar no ensino médio o aluno poderá ser classificado como
semi-alfabetizado.
Alguns perguntam: e a repetência?
Não é para isso que serve?
Até seria, se não fosse os ciclos de
aprendizagem que se transformou em aprovação automática. Caso o aluno tenha
presença, será automaticamente empurrado para o ano seguinte.
Há pouco tempo, a secretaria de
estado da educação de São Paulo tem divulgado as metas para o desenvolvimento
da educação. Pois bem, vejamos:
1º Todos os alunos de 8 anos
plenamente alfabetizados:
Cabe destacar que por mais boa
vontade que este os queiram, enquanto continuar com 40 alunos em uma sala de
aula, torna-se humanamente impossível a alfabetização. Nenhum teórico da
educação até hoje encontrou a formula para tal milagre. Cabe lembrar que
alfabetizar não é ensinar a fazer cópia e sim, pelo menos, ouvir uma palavra e
saber transcreve-la conhecendo o seu significado. Não raro, encontra-se alunos
do ensino médio com defasagem de alfabetização.
2º Redução de 50% das taxas de
reprovação da 8º série:
Como já tratado acima, reprovar não
é punir, e sim oferecer novamente uma oportunidade de ensino. Lembremos que, ao
chegar ao 9º ano do ensino fundamental (ou 8º série) o aluno já trabalha com
conteúdos mais complexos que exige maior concentração e atenção de sua parte.
Se este teve uma alfabetização deficitária e sempre foi feito vistas grossas a
essa deficiência, na 8º série o aluno vai ser reprovado ou novamente vai ser
empurrado para o ensino médio.
3º Redução de 50% das taxas de
reprovação no ensino médio:
Transcrevo aqui as palavras acima e
acrescento: se o aluno nunca teve a cultura de estudar, porque ele deve fazê-lo
agora? O que vai motivá-lo?
Ou melhora-se a estrutura da
qualidade de ensino, ou as aprovações para cumprir essa meta será por decreto.
4º Implantação de programas de
recuperação de aprendizagem nas séries finais de todos os ciclos de
aprendizagem (2ª, 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e 3ª série do Ensino
Médio):
Deve-se deixar bem claro neste ponto
o que é aprendizagem e o que é recuperação. Como recuperar? O que deve ser
trabalhado e como deve ser trabalhado? A recuperação seria a retenção e memorização
de conteúdos ou o desenvolvimento de habilidades?
Ora, se desde o início a sala de
aula fosse reduzida, não haveria necessidade de gastar mais dinheiro com aulas
de reforço, que muitas vezes conta com profissionais não capacitados para esse
tipo de trabalho que envolve metodologias diferenciadas do ensino de massa.
5º Aumento do 10% nos índices de
desempenho do Ensino Fundamental e Médio nas avaliações nacionais e estaduais.
Melhorar o desempenho nessas formas
de avaliações significa tirar melhores notas. Pois bem, aqui temos um ponto
polêmico que merece melhor atenção. Melhorar as notas pode ser entendido como
baixar a qualidade da avaliação. E baixar a qualidade da avaliação significa maquiar
um dado.
6º Atendimento de 100% da demanda de
jovens e adultos de Ensino Médio com currículo profissionalizante
diversificado.
Atender todo o público significa
construir mais escolas e mais salas de aulas, como também pode significar
aumentar a quantidade de alunos na sala de aula. Quanto ao currículo profissionalizante,
muito deve ser feito: laboratório, ampliação de espaços, elaboração de material
e acesso a informações e professores aptos para tais aulas.
7º Implantação do Ensino Fundamental
de nove anos, com prioridade à municipalização das séries iniciais (1ª a 4ª
séries).
No nosso entender, municipalizar é
transferir o problema, é deixar de trazer o compromisso para si e transferir
para outro, se esse outro aceita o problema, ele deve ter estrutura para
atende-lo. Pois a cobrança será maior. Cabe salientar que, se a prioridade é
municipalizar as séries iniciais, as metas 1º e parte da 4º deixa de ser
responsabilidade estatal para se tornar municipal.
8º Programas de formação continuada
e capacitação da equipe.
Formar um professor não significa
necessariamente dar diplomas, acima já discutiu-se a formação continua de um
profissional. Mas se essa formação será em sala com diploma, temos outro
problema. O horário. O que fazer com o professor que se desdobra em várias
escolas para garantir um salário digno para sua família? Uma solução é impedir
que ele tenha outras escolas? Assim como o policial, o professor não poderá ter
dois empregos?
9º Descentralização e/ou
municipalização do programa de alimentação escolar nos 30 municípios ainda
centralizados.
Não sabemos aonde o programa de
alimentação infere na aprendizagem, portanto, esta meta é puramente burocrática
e não compete sua discussão neste texto.
10º Programa de obras e melhorias de
infra-estrutura das escolas.
Para melhorar a infra-estrutura, o governo
deve estabelecer critérios e fazer as devidas comparações (antes e depois da
reforma) afim de evitar perca de recursos. Lidar com dinheiro é extremamente
perigoso pois a própria burocracia criada pelo estado serve para dar margens à
corrupção.
Por fim, melhorar a qualidade de
ensino não significa apenas colocar o professor na escola, podar suas faltas ou
melhorar apenas o seu salário. Melhorar a qualidade de ensino requer uma série
de medidas (simples se pensar um pouco), mas trabalhosa, pois é necessário
mexer em todo o sistema estadual.
IVAN CLAUDIO GUEDES
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